quarta-feira, 2 de julho de 2008

Covardia

Tá doendo. Tá doendo lá dentro do peito. É que quando a realidade é jogada assim na sua cara, não tem jeito. A culpa é toda do Pedro Lago, que escreveu lá no blog dele uma poesia tão minha, que não poderia ter saído dele. Escreveu lindo e claro, e me fez doer. O Pedro fez dele as palavras que há tempos moram dentro de mim. Coisas de poeta… É que poesia não tem fala, impactos de amor não são poesia, me explicaria o Carlos Drummond de Andrade. Poesia é coisa que eu não conseguiria fazer. Calma clama calma, já, já faço copio o texto do Pedro aqui. É que antes tenho que fazer uma ressalva (parece mesmo que eu sempre tenho ressalvas a fazer). Não é orgulho. A palavra não é essa. Também não sei qual é ao certo, se soubesse tinha escrito uma poesia, como fez o Pedro, ou até mesmo um texto, o que seja. Se eu tivesse escrito, talvez colocasse a coragem no lugar do orgulho. É que tem que ser muito covarde para desistir de um castelo tão belo antes que suas paredes estejam de todo levantadas. Onde já se viu desistir do símbolo de um reino assim, só mesmo covarde. O sorriso na face é por não acreditar que o que nem chegou a ser, chegou ao fim. Negação, responderia o Pedro com razão. É que o peito rígido fechado fica mais desgastado com o passar desta anedota, eu responderia com o peito doído, mas ainda assim usando as palavras dele. O esplendor da manhã não se abre com faca, o Pedro está certo, diria a Mariana Filgueiras se lesse esse blogue e se intrometesse na conversa. Sou voto vencido. Cabe somente a mim conseguir descobrir se fazer o bem àqueles que não são mais espelhos - não consigo colocar em palavras, talvez peça ajuda ao Pedro. Voltando: cabe somente a mim descobrir se fazer o bem àqueles que não são mais espelhos é parte do ser infinitamente harmônico que sou (será?), ou manobra para adiar a partida, fugir dos olhares da despedida, porque até o para sempre tem um fim. Só que até as alcachofras têm coração…
Enfim, de volta à vaca fria, aí está a tal poesia do Pedro.

Orgulho juvenil

Embriagada por reflexos quebrados,
finge não ver pela face,
a óbvia harmonia do virar da página,
escrita em palavras soltas
que outrora compunham o romance.

Defende-se dos doces ventos,
sorrindo sem sorrir verdadeiramente
na vã negação à imagem,
que se desfaz em lentas erosões
pelos muros de areia seca
de um castelo que não foi,
mas seria lembrada sua estrutura.

Orgulho juvenil,
derrota da lágrima pura,
cairía simples como o orvalho
mas esbarra na postura frívola,
trazendo riso falso a quem
não reconhece a própria face,
agora mudada,
pela fresta quebrada
do espelho que não há.

Como é duro interpretar
personagens sem estado.
Vazios como armaduras de lata
que nada passam ao olhar
da platéia única, que agoniza
no gelo da ausência de vida cênica,
sem ballets nem cantos,
apenas o rígido peito fechado
que fica mais desgastado
no decorrer desta anedota.

Vale mais ser harmônico,
reconhecendo o passar da estação,
sem mágoas e negação,
e sentir o pesar da partida,
lamentar o olhar da despedida
depois sorrir à nova ilusão.

Não permita o ar da postura
pois é isso que faz a fissura,
e mancha de vez a composição,
que deve ser bela e inocente,
afinal é nela que há deleite
da plena realização.

Um comentário:

Pedro Lago disse...

Ferreira Gullar disse uma vez e faço as minhas palavras: "A obra de arte, se tocar uma única pessoa que seja, já está justificada".
Obrigado,
Pedro Lago.