quarta-feira, 11 de junho de 2008

Um armário entre nós dois*

“Você quer um armário, passa nas Casas Bahia e compra!” Essa foi a segunda frase que ela disse a seu futuro marido. A primeira foi “O que aconteceu com o meu primo?”. Pode fazer pouco sentido quando contamos a história assim, sem mais apresentações. Mas o fato é que Marcelo e Fernanda estão casados há um ano e meio por causa de um armário, herança do avô da moça.
Desde pequeno, Marcelo rondou a vida de Fernanda sem saber que ela seria a mulher da sua. Ele era o melhor amigo do primo dela mas nove anos de diferença é uma grande muralha, quando se é adolescente. E olha que eles não se viam pouco. Aniversário de 14 anos de Fernanda, lá estava ele. Enterro do primo distante, idem. Jantar natalino, o garoto era presença certa. “Eu ficava pensando, quem é esse cara que está sempre em todo lugar?”, lembra Fernanda.
E enquanto ela completava 23 anos, na casa dos pais, ele, aos 32, planejava sair da dos dele. Aí é que entra Dona Iolanda, vó de Fernanda, íntima de Marcelo. Ela sabia que ele iria montar sua própria casa e ofereceu o tal armário. “Olha, eu tenho uma neta que há 17 anos guarda um armário que era do avô dela. E já que ela não deve estar usando, liga para ela te emprestar...” E o Marcelo ligou. Escolheu o momento menos apropriado de todos, mas ligou.
Quando o telefone tocou, Fernanda estava em Brasília, com uma companhia de teatro de rua. Em cima de uma perna-de-pau, a moça ainda se equilibrou para atender a ligação. “Alô”, ela disse. “Oi, Fernanda, aqui é o Marcelo, amigo do seu primo”, disse ele. E emendou, dizendo que queria o armário do avô dela. Fernanda, do alto das suas pernas de pau, ficou tão irritada com a proposta (afinal o armário tinha um valor sentimental e estava na família há anos) que a única coisa que conseguiu responder foi a frase que evoca a Casas Bahia, citada no começo deste texto. E bateu o telefone. Em seguida ligou para a vó Iolanda e disse que não ia dar o armário para ninguém, que a única pessoa que teria aquele móvel um dia seria o marido dela – e só porque eles dividiriam a mesma casa. D. Iolanda não pensou duas vezes, pegou o telefone e ligou para o Marcelo. “Ela disse para ele que eu não quis mesmo dar o armário, mas que tinha dito uma coisa interessante: que a única pessoa que teria aquele móvel seria quem casasse comigo”, lembra. Não deu meia hora e o Marcelo ligou de novo para Fernanda. “Aceitei sua proposta”. E ela: “Que proposta? Já falei que não vou dar o armário!” “Quero casar com você”, mandou o homem e a fazendo, literalmente, cair das pernas-de-pau.
Quando voltou para casa, depois de 6 semanas viajando, a única pessoa esperando Fernanda no aeroporto, advinha, era Marcelo. “Ele vestia uma camiseta do teatro dos anônimos, não acreditei. Tinha tudo a ver”, lembra ela. Depois de namorarem 3 anos, o casal, enfim, juntou os trapos no tal armário do avô de Fernanda.

*Publicado na revista Domingo, do JB

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