sexta-feira, 11 de maio de 2007

Peitos Peixes

Quando eu era criança, rodava até ficar tonta no salão forrado de tapetes persas da casa da minha avó. Quando já estava caindo, tentava pular de tapete em tapete sem tocar no chão. Não passaram muitos anos até que eu percebesse que os peitos pareciam peixes. Em algum momento entre a fila do pão quente e o esperado sinal da saída, li no jornalzinho da escola que os peitos pareciam peixes e nunca mais me esqueci.

Eu que já era de peixes, com o passar do tempo, me tornei peitos.

EU TENHO PEITO! Que mentira, eu não tinha peito para encarar coisa alguma. Não gostava nem de pensar no poder que eles poderiam me fornecer. O medo da sedução e, principalmente, da perda. Eu escondia os peitos até o dia em que André se apaixonou. Por mim não, pelo par de peitos. Dentro de todos os meus temores, esse era o maior. André ganhou nome em minha vida com palavras de escritor. Me apaixonei por aquele que tinha descoberto minha qualidade preferida. Me tornei só dele no dia em que senti sua mão subindo pela minha cintura e se tornando o complemento para os peitos peixes.

Hoje, sinto ânsia do amor.

O suor escorre pelas minhas costas. Acabamos de fazer amor e a culpa é dos peixes. Se não fossem eles, não estaria tão enojada com essa intimidade toda. Estou me levantando e ele vem atrás. Não, ele não é o André, mas isto não importa. Ele mal ligou a água quente e a fumaça já embaçou o espelho. Não consigo enxergar que os peitos parecem peixes. Sabonete, shampoo, toalha, calcinha, sutiã, vestido, sandália – humm, essa aqui – secador, batom e um beijo no meu amor. Elevador. O porteiro sempre olha estranho quando eu passo. Acho que ele olha para os peitos. Tenho vontade de tocá-los só para deixá-lo saber que sei para onde olha. Escuto passos rápidos vindo da direção da escada. Escuto a voz que ainda há pouco sussurrava no meu ouvido. O encaixe perfeito dos peixes toca meu ombro esquerdo. Eu paro. Me viro surpresa. Uma das mãos segura o meu braço, ao mesmo tempo que a outra, que minutos antes acariciava o meu peito, o dilacera com uma navalha.

Nenhum comentário: